Acompanhando os posts de aspirantes a escritores nas redes
sociais, percebo que uma das maiores angústias dos escritores é justamente a
procrastinação com o ato da escrita. Num mundo como o nosso, onde a maioria das
pessoas vive de torpedos e twitts de 140 caracteres, pensar em dedicar longas
semanas a um único manuscrito pode soar como uma atividade extenuante e
aborrecida, cuja execução vai proporcionar longos períodos longe de outras
coisas que o autor poderia fazer, pensamento que é outro motivo de angústia: o
da culpa por não se dedicar o suficiente a sua obra.
Na verdade, tudo é uma questão de motivação.
É simples colocar assim, mas não é simples explicar como uma pessoa pode se
motivar a fazer algo. Por isso achei por bem que deveria partilhar um pequeno
resumo sobre o que sei do assunto, que foi parte dos estudos da matéria
“Psicologia da Educação”, que estudei no curso de Licenciatura da faculdade
Claretianas.
O curso era voltado a professores, que precisam motivar seus
alunos a estudar e a aprender coisas que, a princípio, parecem não servir pra
nada. Porém, entender os mecanismos da mente humana pode ser determinante na
hora de estabelecer prioridades na sua vida e decidir se escrever é mesmo o que
lhe trará felicidade. Vamos ao assunto?
Existem dois tipos de fatores que levam uma pessoa a
determinados comportamentos: a motivação extrínseca e a intrínseca.
Como você deve imaginar, a motivação
extrínseca é aquela que vem de fora e que age sobre o indivíduo.
Elas incluem recompensas, ganhos financeiros, pressão social, punição,
prestígio, ascensão social e outros. São as coisas que você pode ganhar ou
perder ao fazer ou não o que deve fazer (uma criança pode fazer o dever porque,
se não o fizer, vai apanhar da mãe), que levam o indivíduo à realização.
Talvez para alguém que já seja famoso tornar-se escritor
pode ter motivação extrínseca. No meio artístico, por exemplo, um ator que
também escreve é visto como um intelectual, e o livro escrito por ele agrega
conteúdo ao seu currículo profissional e possibilita que ele alcance novos
projetos em sua carreira. Em outro exemplo, um ator que já tem uma fama
consolidada pode pensar que dedicar-se a um roteiro de filme (acredite, é tão
ou mais complicado que escrever um livro), pode levá-lo a um novo patamar na
carreira, a novos desafios, e valorizá-lo ainda mais por sua própria profissão.
Ou, ilustrando casos mais comuns, um aluno pode se sentir extrinsecamente
motivado a escrever uma monografia de 150 páginas quando ela será necessária
para concluir sua graduação de 5 anos, por exemplo.
Para um indie, como eu, a motivação extrínseca não pode ser
predominante. Normalmente, todo profissional fantasia ter sucesso na carreira.
Como independente, não posso deixar de admitir que me pego imaginando como
seria se eu pudesse me dedicar dia e noite apenas aos meus livros, viajar o
mundo dando palestras e lançando novos Best Sellers, e descobrir que não há uma
livraria do mundo sem um exemplar dos meus textos. Mas esse tipo de pensamento
não deve e não pode nortear a carreira de um escritor iniciante, pois muito
provavelmente não é assim que as coisas vão acontecer. Mesmo quando acontecem
com pessoas comuns, como foi o caso da famosíssima J.K.Rowling, existiu muita
dedicação anterior e várias portas na cara, e se concentrar apenas na glória
final leva, invariavelmente, à decepção. Sonhos são importantes, mas os
caminhos até a conquista deles são mais importantes ainda.
E isso nos leva ao segundo tipo de motivação: as motivações intrínsecas.
"Quando estamos intrinsecamente motivados, não
necessitamos de incentivos ou punições, pois a atividade em si é
recompensadora" (WOOLFOLK, 2000, p. 327). É o tipo de comportamento que
vem do interesse e da curiosidade. Ela não depende de receber algo em troca do
que se faz, nem de ser reconhecido pelo que se faz, e normalmente é um
sentimento persistente, que não esvanece com a conquista de uma recompensa, nem
com a ausência dela.
E é nesse sentimento interior que o escritor deve criar para
desenvolver seu texto. Ver materializada uma história que tem em mente,
livrar-se do peso de carregar as vidas imaginárias de personagens que povoam o
imaginário do autor, ter histórias próprias para ler para os seus filhos antes
de dormir ou registrar uma experiência que você não quer esquecer jamais, são
exemplos de motivação intrínseca.
Concentrar-se em um tipo de motivação não quer dizer que
você não possa pensar no outro tipo. Se for possível desenvolver e receber os
dois tipos de motivação, tanto melhor para seu crescimento profissional e para
a conclusão dos seus textos. O autor pode, por exemplo, se sentir orgulhoso por
ver seu nome estampado na capa de um livro, gostar de receber elogios e ter uma
“injeção de ânimo” ao testemunhar as vendas acontecerem numa sessão de
autógrafos, desde que isso apenas complemente a vontade interior que ele tem de
se expressar, de concluir sua obra por razões internas.
Uma dica para impulsionar a
motivação na parte mecânica da coisa, a digitação:
Estabeleça uma meta de digitação diária, mas não preencha
todos os dias da semana com esse cronograma. Você verá que na primeira e na
segunda semana precisará de perseverança e paciência, mas se sua proposta
pessoa for escrever 5 páginas por dia, ao final de duas semanas terá 50
páginas, e isso é quase a metade do que têm a maioria dos livros independentes
que tenho lido. Não se proponha, no entanto, a escrever 20 páginas por dia,
pois além de arrebentar com seus tendões e precisar de vários dias pra se recompor,
esgotar sal determinação num dia só pode fazer o efeito contrário ao esperado,
e desanimá-lo mais que animá-lo.
E principalmente: divirta-se com o que escreve. Se sua
história não está cativando nem mesmo você mais, então é hora de reformulá-la
ou partir para projetos mais interessantes. Livro são aventuras para quem lê,
mas pra quem escreve pode ser a jornada de sua vida, então que seja uma jornada
prazerosa.
X
Estabelecer metas factíveis ajuda bastante. Nada é mais frustrante que não conseguir cumprir o que se propõe, não é? Por outro lado, a motivação principal, para mim, vem do prazer em narrar uma boa história.
ResponderExcluir